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Perspectivas do Comércio Exterior Brasileiro para 2024

Fazer previsões em comércio exterior é algo tão difícil quanto tentar prever qual o time que será campeão em um ano que nem iniciou. Por isso, temos que partir de dados históricos mais recentes, em conjunto com o ecossistema que envolve o assunto a ser estudado e projetado. Em comércio exterior, as dificuldades se ampliam quando queremos prever os acontecimentos para o próximo ano, pois não bastam os últimos fatos ocorridos nessa área para desenvolvermos uma projeção segura.

Dependemos muito do que ocorre no cenário internacional, na economia interna e da força de transformação do País, para se adequar às necessidades de mercado e tornar-se mais competitivo. Entretanto, podemos já visualizar algumas tendências que podem ter impacto no segmento em 2024:

Impacto das Atuais Guerras no Comércio Internacional

Nossas projeções das expectativas do comércio exterior brasileiro para 2024, começam pelos conflitos militares que levam a uma instabilidade no mercado internacional e que devem continuar influenciando o comércio mundial. Por exemplo, apesar de uma participação pouco expressiva no comércio e produção mundial, Rússia e Ucrânia eram grandes fornecedores de commodities, cujo abastecimento continua ameaçado pela guerra, e com isso, os impactos econômicos dessa crise tem sido um aumento nas vendas de commodities por parte de outros países, o que beneficia o Brasil que vem usufruindo de alta tecnologia para aumentar a produção.

Em conjunto com outros cenários, o Brasil tem ocupado espaços importantes no mercado mundial e deverá continuar forte dentro desse segmento, aproveitando-se dessa nova ordem econômica mundial e das relações conturbadas entre Estados Unidos e China. Lembramos que o Brasil superou esse ano a produção de milho em relação aos Estados Unidos, o que não acontecia desde 2013, segundo o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), e que no período entre janeiro e outubro de 2023 tivemos um aumento em 7,2% no setor agropecuário, em relação ao mesmo período de 2022.

Expectativas com os Acordos Internacionais

Também, destacamos como perspectiva para 2024 as assinaturas de novos Acordos Comerciais. O Brasil está em conversa comercial com diferentes blocos e países, e isso deverá ter um resultado mais efetivo em 2024, principalmente em decorrência da entrada da diplomacia brasileira para o desenvolvimento do fluxo do comércio exterior e atração de novos investimentos. Lembrando que o Brasil atualmente preside os blocos BRICS e Mercosul, e isso deve dar ainda mais força nessas negociações.

Salientamos aqui a provável assinatura do Acordo Comercial entre Mercosul e União Europeia (UE). Sendo esse acordo ratificado, o Brasil passará a ter acesso preferencial ao mercado dos 27 países membros do bloco europeu, com isso, há uma expectativa de aumento na geração de empregos e um substancial aumento no volume de exportação por parte dos países envolvidos. Lembrando que a UE é o segundo maior parceiro comercial do Mercosul e este, por sua vez, é o oitavo principal parceiro da UE.

Novo Processo de Importação (NPI)

Outro ponto importante em que o Brasil precisa investir cada vez mais, para minimizar seus impactos, são as burocracias que elevam os custos e riscos dos processos de comércio exterior. Nesse sentido, a importância de desburocratizar os processos vem ao encontro da necessidade atual do comércio internacional. 

Um dos pontos relevantes para minimização da burocracia, são os investimentos no Novo Processo de Importação (NPI). Esse novo processo visa um fluxo único e computadorizado das informações inerentes à operacionalização na importação, assim como ocorreu na exportação com a Declaração Única de Exportação (DU-E), que será utilizada por todos os órgãos governamentais e empresas privadas que participam dos processos de importação.

Em outras palavras, o importador prestará aos órgãos intervenientes todas as informações necessárias à concretização de suas operações uma única vez. Esse processo unifica a importação, através do Catálogo de Produtos, Operador Estrangeiro, Declaração Única de Importação (DUIMP), Licença, Permissão, Certificado e Outros Documentos (LPCO), Pagamento Centralizado de Comércio Exterior (PCCE) e sistema de Anexação de documentos.

Há uma grande expectativa que esse novo processo se tornará obrigatório no início de 2025. Para isso, as empresas importadoras e todos os seus parceiros precisarão estar aptos e realizando essas operações já no ano de 2024.

É importante que se faça toda a equalização dos seus dados (cadastros, atributos de produtos e mercadorias etc.) para que essa nova forma de executar os processos de importação não traga turbulência às empresas, e sim, mais transparência e agilidade em seus processos. A expectativa é que, com esse novo modelo de importação, haja um impacto econômico positivo no aumento da corrente de comércio e no PIB.

Perspectiva para a Balança Comercial 2024

Assim, considerando os pontos abordados anteriormente, destacamos também a estagnação nos últimos tempos, dos investimentos produtivos, que tende a ser superada caso as medidas anunciadas pelo governo federal, no novo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e outras mudanças que impactam nosso comércio, entrem em vigor de forma urgente.

Os investimentos são importantes para que possamos superar a balança comercial desse ano, que já é um recorde, quando comparada à de 2022. Entre janeiro e outubro de 2023, nossa balança comercial chegou à marca de US$ 80,21 bilhões, com um crescimento no mesmo período, em relação a 2022 de 57,2%. No entanto, a corrente de comércio registrou queda de -5,3%, atingindo US$ 484,73 bilhões.

Dessa forma, o superavit na balança comercial não está embasado na elevação dos preços na exportação, mas principalmente, no aumento do volume das exportações e na diminuição das importações, que caíram -12,2%. Entretanto, ainda continuamos dependentes das vendas em commodities e isso deve continuar em 2024.

Para o segmento industrial de transformação, que no período de janeiro a outubro de 2023, houve uma queda nas exportações de -3,2% em relação ao mesmo período de 2022, é esperado que as reformas que vem sendo promovidas pelo governo e o investimento do setor em novas tecnologias façam o segmento industrial crescer no mercado internacional.

Há expectativa que algumas mudanças importantes possam melhorar nossa competitividade no mercado internacional, através de reformas trabalhista e tributária, por exemplo. A tributária, principalmente, com as últimas aprovações dentro do Congresso Nacional, abre novas perspectivas para nossas empresas diminuindo a burocracia tributária e os valores de impostos dentro da cadeia de transformação industrial. Porém, precisamos considerar outros pontos importantes para a elevação da nossa corrente de comércio exterior como a elevação da qualificação da mão de obra, melhorias no processo logístico, e que nossas empresas explorem ainda mais os regimes aduaneiros especiais brasileiros.

Possíveis Impactos da Reforma Tributária

Conforme abordado no tópico anterior, a expectativa é que a Reforma Tributária traga bons frutos para o comércio exterior.

Entre os objetivos da Proposta da Reforma Tributária, está a possível criação de três formas de arrecadação de impostos, sendo eles: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) que terá sua receita administrada pela União; o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) com a receita administrada pelos Estados e Municípios.

A partir da CBS e do IBS será definido o Imposto Sobre o Valor Agregado (IVA) dual, o qual será efetivado por meio de lei complementar. Ressaltamos que até o momento, não há citação no relatório da PEC sobre qual será sua alíquota.

Adicionalmente aos citados acima, está em proposta a criação do Imposto Seletivo (IS), que será compartilhado entre União, Estados e Municípios e incidirá sobre bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, de forma a desincentivar a produção e o consumo destes.

No que concerne à importação de bens e serviços, incidirão os seguintes tributos: Imposto de Importação, CBS, IBS, IS, taxa Siscomex, AFRMM, taxa Mercante e Cide-combustíveis.

Essa será uma mudança significativa, pois simplificará o processo de recolhimento dos impostos, pois o importador não precisará se preocupar com particularidades dos estados e municípios, até então existentes sobre as legislações de ICMS e ISS (quando na importação de serviços).

A proposta da reforma tributária também inclui a criação de mecanismos para assegurar os benefícios existentes na Zona Franca de Manaus e das Áreas de Livre Comércio, por meio dos regimes aduaneiros aplicados em áreas especiais.

Existe uma visão positiva por parte do governo e de alguns setores privados, com a perspectiva da unificação, acreditando que irá trazer competitividade, maior transparência, pois o consumidor saberá quanto pagará de imposto em seu produto, além da facilidade na tributação e segurança jurídica.

A expectativa com a unificação é uma redução no Custo Brasil, que hoje consome em torno de 38% do lucro anual das empresas, com o pagamento de impostos, que equivale a cerca de R$ 1,7 trilhão (dados de 2023 - equivalente a 19,5% do PIB nacional), dados elaborados pelo Movimento Brasil Competitivo (MBC).

Essa expectativa é bastante positiva, uma vez que o Custo Brasil é o maior pesadelo dos empresários brasileiros, e de empresas estrangeiras. No caso do Brasil, os altos custos com tributos tornam nossos produtos mais caros, prejudicando sua concorrência no mercado externo.

Já as empresas estrangeiras, se deparam com a complexidade na aplicação dos impostos e contribuições, considerando que no Brasil, incidem sobre consumo o ICMS, ISS, IPI, PIS/Pasep e COFINS, somando-se a isso as regras próprias dos 27 estados para o ICMS, e, por fim, o ISS com regras distintas para cada um dos 5.570 municípios. Enquanto em outros países, há somente incidência do Imposto sobre o Valor Agregado (IVA).

Podemos ver que muitas são as expectativas com a Reforma Tributária, mas também sabemos o quanto é complexa a sua aprovação.

Para finalizar nossa análise, temos que considerar as consequências das eleições na Argentina, que é um dos maiores parceiros comerciais do Brasil dentro do Mercosul. É certo que, com uma economia frágil, não se espera uma ruptura nas relações comerciais argentinas de forma  abrupta. Porém, poderemos ter ao longo  do novo governo eleito uma nova formatação em relação ao Mercosul, bem como uma busca mais individualizada de acordos, que não considere o bloco nessas negociações

Observamos que as expectativas para 2024 são positivas, porém, é necessário considerar que, para que isso se concretize, temos que:

  • Contar com um cenário econômico internacional menos turbulento
  • Nossas políticas públicas sejam levadas a termo
  • Controle sobre a inflação na economia interna
  • Equilíbrio nas contas públicas por parte do governo
  • Combate aos problemas logísticos que elevam os custos nas operações de comércio exterior
  • Constante preocupação para minimizar a burocracia 
  • Fechamento de novos acordos comerciais, principalmente com blocos ou países que tenham um comércio significativo com Brasil
  • Empresas atuantes no comércio exterior possam propor novos diferenciais de mercado, como, por meio do uso da alta tecnologia,
  • E, por fim, que haja uma parceria entre iniciativa privada e governo, na abertura de novos mercados etc.

Como notamos, há muito a ser feito para que seja um ano positivamente diferenciado para o comércio exterior brasileiro, e assim alcançarmos destaque nas nossas relações comerciais em 2024.

Sobre o autor

Luis Sena - Especialista em Soluções Operacionais da divisão de Comércio Exterior da Thomson Reuters no Brasil. Acumula mais de 20 anos de experiência no desenvolvimento de produtos e serviços relacionados as operações de comércio exterior. Participou em mais de 50 projetos de implantação e no acompanhamento de auditorias fiscais do regime de Drawback.

Sobre o autor

Equipe editorial de Comércio Exterior da Thomson Reuters - Diego Oliveira, Angela Maria dos Santos e Evandro Salgado.